Reforma da Previdência atinge mais necessitados

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Reforma da Previdência atinge mais necessitados

Desde que foi anunciada, no dia 6 de dezembro, a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 287/2016 trouxe consigo uma série de dúvidas e temores. A também chamada reforma da Previdência contempla mudanças significativas para benefícios direcionados aos segurados mais carentes do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). O maior impacto será sentido nas regras de concessão da pensão por morte.

Segundo o governo federal, nas pensões por morte os valores pagos às viúvas ou viúvos serão de 50% da aposentadoria do segurado morto, com adicional de 10% para cada dependente. O valor pago será, portanto, igual a 60% no caso de um dependente, e de 100% para os que tiverem cinco dependentes. Essa cota não se reverterá para o parente ainda vivo quando o filho completar 18 anos de idade.

Ou seja, o valor poderá ser abaixo do salário mínimo. O texto da reforma também deixa explícito que não será possível acumular o benefício com outra aposentadoria ou pensão.

Na opinião de especialistas, as mudanças da pensão por morte significam um retrocesso e contrariam a lógica do seguro social. “Essa redução no valor da pensão por morte é injustificável, pois o benefício em questão tem natureza previdenciária e substitui a renda do segurado falecido, sendo devido aos seus dependentes. O segurado contribui mensalmente sobre o valor integral do seu salário de contribuição, justamente com o objetivo de que os dependentes possam receber o benefício em questão caso ele venha a falecer. A contribuição do segurado não incide apenas sobre uma parte do salário de contribuição, tornando injusto que os dependentes recebam apenas um percentual do valor da aposentadoria, contrariando a lógica do seguro social”, avalia o professor e doutor em Direito pela USP Gustavo Filipe Barbosa Garcia.

“De acordo com a proposta atual, o coeficiente de 100% da pensão é sobre o valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito fosse aposentado por incapacidade na data do óbito. Acontece que os proventos da aposentadoria por incapacidade permanente para o trabalho somente serão de 100% quando decorrentes de acidente do trabalho; nos demais casos, será aplicado coeficiente de 51% da média das remunerações e dos salários de contribuição utilizados como base para as contribuições, acrescidos de um ponto percentual, para cada ano de contribuição considerado na concessão da aposentadoria”, observa o advogado previdenciário Diego Henrique Schuster.

Os especialistas citam como exemplo o caso de um segurado do INSS que deixar a mulher e um filho como dependentes ao morrer. Os dois dependentes receberão, juntos, o total de 60% do que o beneficiário recebia de aposentadoria (50% somados a uma cota individual de 10%).

Um dos pontos da reforma apontados como inconstitucional pelos especialistas é o valor da pensão por morte poder ser inferior a um salário mínimo. “Essa proposta fere o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Nenhuma pessoa que viva com menos de um salário mínimo pode se alimentar, vestir e ter moradia digna”, defende o advogado João Badari, sócio do Aith Badari e Luchin Advogados.

Na visão de Schuster, a medida vai na contramão da Constituição. “Qual o argumento ‘técnico’ para isso? A pensão por morte é uma espécie de seguro e não tem como finalidade substituir a renda mensal. A Previdência Social já não é uma espécie de seguro? Seria a pensão por morte um seguro dentro de um seguro? É de se ver que não estão apenas brincando com os números, mas com os conceitos. A pensão por morte visa proteger os dependentes contra a extinção ou redução inesperada da fonte de sustento da família pela morte do segurado, e não servir de esmola”, afirma.

Pagamento do BPC também será afetado

Outro ponto polêmico da proposta de reforma da Previdência é a alteração da idade mínima para o recebimento do BPC-Loas (Benefício de Prestação Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social), que passará de 65 para 70 anos. O benefício garante um salário mínimo mensal a idosos e pessoas com deficiência física, mental, intelectual ou sensorial. Os idosos ou deficientes que tiverem 65 anos na data da promulgação não serão afetados pela medida. A transição da idade mínima de 65 para 70 anos será gradual, com o incremento de um ano de idade a cada dois anos, conforme anunciou o governo federal.

“Trata-se de uma grande injustiça o aumento da idade mínima para 70 anos para receber um salário mínimo, previsto nas regras do BPC. É um benefício destinado às pessoas em situação de miserabilidade. Elas terão que esperar completar 70 anos para ter uma vida digna, para conseguir se vestir, ter o que comer, para comprar remédios. Isso não pode passar no Congresso Nacional”, observa João Badari.

Para ter direito ao BPC-Loas, é necessário que a renda por pessoa do grupo familiar seja menor do que um quarto do salário mínimo vigente. E por se tratar de um benefício assistencial, não é necessário ter contribuído ao INSS para ter acesso a ele.

O professor de Direito Previdenciário e doutor e mestre em Direitos Humanos Marco Aurélio Serau Junior entende que se trata de uma mudança drástica, que levará milhares de pessoas à situação de miséria. “É muito preocupante, pois a faixa de 70 anos estabelecida pela PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Previdência como idade mínima para receber o benefício pode ser revista e ampliada conforme o tempo. Totalmente inadequada a proposta para um benefício que serve para amparar uma camada pobre da população.”

Segundo Diego Schuster, a PEC da Previdência é afronta ao Estatuto do Idoso. “De que adianta o estatuto proteger a pessoa com idade igual ou superior a 60 anos se ela somente poderá se aposentar com 65 anos ou obter amparo assistencial aos 70 anos, caso se encontre em situação de miserabilidade? Segundo o artigo 9º do referido diploma, ‘é obrigação do Estado garantir à pessoa idosa a proteção à vida e à saúde, mediante efetivação de políticas sociais públicas que permitam envelhecimento saudável e em condições de dignidade’”, pontua.

O advogado ressalta que “o amparo assistencial visa proteger o idoso em situação de risco (miserabilidade) e não premiar aquele que conseguir sobreviver, com renda familiar inferior a um quarto do salário mínimo, até os 70 anos de idade”.

Para Schuster, essa medida viola os princípios da coerência e integridade do direito, da isonomia, da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana, todos contemplados na Constituição Federal.

Gustavo Garcia avalia que o governo federal, com essas medidas que atingem os mais necessitados, está desvirtuando o real significado da Previdência Social. “Como o próprio nome indica, a Previdência Social é um direito humano, fundamental e social. Esquece-se que a razão de ser da Previdência, como a sua própria evolução histórica revela, é garantir a subsistência digna das pessoas, mas não excluí-las e deixá-las à margem da sociedade, dependendo de caridades voluntárias para se manterem vivas. A sociedade não pode ficar passiva diante desse cenário tão sombrio e injusto de proposta de reforma previdenciária”, aponta.
Pensão e aposentadoria têm contribuições separadas

O professor de Direito Previdenciário e doutor e mestre em Direitos Humanos Marco Aurélio Serau Junior alerta que é inadequada a proposta do governo que impede a acumulação da pensão com morte com a aposentadoria. “Proibir a acumulação é ferir o caráter contributivo do sistema previdenciário. São benefícios que têm fatos geradores distintos. Existem contribuições para os dois benefícios de forma separada”, afirma.

“O segurado tem direito à aposentadoria por ter contribuído e ter preenchido os requisitos para ter acesso ao benefício. E ele também tem direito à pensão por morte, pois o segurado falecido também contribuiu com a Previdência Social para que seu cônjuge e dependentes tivessem acesso ao benefício”, explica.

De acordo com o secretário da Previdência Social, Marcelo Caetano, as novas regras, se aprovadas pelo Congresso Nacional, teriam validade somente para as pensões concedidas a partir daquele momento. Ou seja, não atingirão as pensões já pagas, consideradas pelo governo federal como direito adquirido.

Caio Prates / Do Portal Previdência Total

Fonte – Diário Grande ABC

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